Introdução
A coluna vertebral é um conjunto de vértebras empilhadas com mobilidade entre
si, que serve de eixo ao esqueleto do corpo e de proteção à medula espinhal.
Sua estabilidade depende das forças de todas as unidades motoras e acontece por
meio de ligamentos, além dos músculos intrínsecos e extrínsecos do tronco
(KAPANDJI, 2007; PEREIRA et al., 2006).
Ortega (2007) afirma que a coluna é composta por quatro porções: a cervical,
com 7 vértebras; a torácica, com 12 vértebras; a lombar, com 5 vértebras, e
a região sacrococcígea, formada pela fusão de até 5 vértebras sacrais e 4
coccígeas. Os movimentos desse segmento corporal combinam a rigidez das
vértebras com a flexibilidade dos discos intervertebrais, ocorrendo em três
planos de movimento.
Milbradt et al. (2011) acrescentam que existem curvas fisiológicas da
coluna vertebral encontradas no plano sagital: a cifose, com convexidade
posterior, e a lordose, com convexidade anterior. No plano frontal pode ser
encontrada uma curvatura lateral considerada patológica chamada de escoliose.
Pereira et al. (2006), complementam que a literatura indica três tipos
de desvios posturais patológicos da coluna vertebral: a hipercifose, a
hiperlordose e a escoliose, sendo a última a mais deformante.
De acordo com Rego e Scartoni (2008) o corpo se adapta com o tempo às posturas
utilizadas por período prolongado. Com isso, os tecidos moles do lado da
concavidade encurtam-se e do lado da convexidade alongam-se, promovendo
desequilíbrios na musculatura, levando à alteração na coluna vertebral e
conseqüentemente a uma má postura.
Além disso, os autores supracitados afirmam que essas alterações são
conseqüência de alguns fatores, tais como a má postura, a condução
inadequada de objetos, a obesidade, o sedentarismo, as tensões e a
inadequação do mobiliário, a exemplo de cadeiras e mesas escolares.
Sendo assim, o ambiente escolar é considerado um fator externo que pode levar a
alterações posturais em crianças e adolescentes, fazendo com que desenvolvam
disfunções ortopédicas e reumatológicas na vida adulta (MINGHELLI et al.,
2009).
O uso incorreto das mochilas provoca modificações na postura para compensar
seu peso, produzindo uma mudança do centro de gravidade para trás e uma
conseqüente inclinação do corpo para frente, ocasionando o aumento da demanda
muscular lombar na região de L5-S1 e, conseqüentemente, dores locais (ORTEGA et
al., 2010; CANDOTTI et al., 2009; AINHAGNE e SANTHIAGO, 2009).
A postura sentada leva a alterações musculoesqueléticas, principalmente na
região lombar, visto que a mudança de postura de pé para sentada aumenta em
35% a pressão do disco intervertebral L3. Ao passar longo período de tempo
sentado incorretamente, a pressão intradiscal aumenta em 70%, promovendo
desconfortos maiores tais como dor, sensação de peso, formigamento e,
posteriormente, o desenvolvimento de hérnia discal (ZAPATER et al.,
2004; AINHAGNE e SANTHIAGO, 2009).
Dados epidemiológicos mostram alta prevalência de alterações na coluna
vertebral entre crianças e adolescentes. Assim, os fatores que causam problemas
posturais em 80% dos adultos têm início na infância e consolidam-se na
adolescência. No Brasil, estima-se que 70% dos jovens entre 5 e 14 anos de
idade possuem ou vão adquirir alguma alteração postural (OSHIRO et al.,
2007; MARTELLI e TRAEBERT, 2006; MONTESINOS et al., 2004; XAVIER et al.,
2011).
Segundo Salazar et al. (2011), as algias são atribuídas às Atividades
de Vida Diária (AVDs), realizadas pelas crianças nos tempos modernos, e ao
excesso de peso das mochilas, que é incrementado significativamente com o
passar dos anos escolares.
Candotti et al. (2010), Vieira e Vieira (2011), Fornazari e Pereira
(2008) e Lunes et al. (2010) enfatizam que adquirir uma postura adequada
durante a infância ou corrigir precocemente desvios posturais possibilita um
padrão postural correto na vida adulta, já que a idade escolar é uma fase
ideal de recuperação de disfunções da coluna vertebral de maneira mais
eficaz, visto que se trata do período de maior importância para o
desenvolvimento musculoesquelético.
A escola é mais um local de atuação do fisioterapeuta, onde podem ser
aplicados técnicas e recursos para a realização do diagnóstico precoce, da
prevenção e do tratamento, a fim de combater o aparecimento e a evolução
dessas alterações posturais (BACK e LIMA, 2009).
Diante do exposto e tendo em vista que grande parte da população mundial passa
11 anos de sua vida na escola, esta pesquisa tem como principal objetivo
investigar as ações da fisioterapia nas alterações biomecânicas da coluna
vertebral em escolares do ensino fundamental.
Metodologia
Realizou-se uma revisão sistemática de artigos nas bases de dados do SCIELO (Scientific
Electronic Library Online), BIREME (Biblioteca Regional de Medicina), LILACS
(Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde). Para a busca,
foram utilizados os descritores: desvios posturais, influência da mochila e
cadeira, fisioterapia e crianças, bem como seus correspondentes em espanhol.
Essas palavras-chave poderiam estar no título ou no resumo. Incluíram-se os
estudos que relatassem as ações da fisioterapia dentro do ambiente escolar sem
delimitação do tipo de estudo, publicados nos idiomas português e espanhol
entre 2004 e 2011.
O estudo foi realizado de fevereiro a novembro de 2012. A busca foi conduzida de
fevereiro a abril de 2012, na qual foram identificados 31 artigos referentes ao
assunto abordado, dos quais 8 abordavam as ações fisioterapêuticas. Foram
excluídos artigos que tratavam sobre adolescentes ou crianças portadoras de
deficiências físicas, auditivas ou visuais, ou que não obedeciam aos
critérios de inclusão supracitados.
Foi realizada uma análise descritiva dos dados extraídos dos estudos
selecionados, resultando em uma tabela contendo autores e ano, tipo de estudo,
amostra total, ações fisioterapêutica e principais resultados encontrados.
Resultados
e discussão
As alterações posturais podem acarretar conseqüências maléficas para o
organismo, como a dor, já que o indivíduo convive com dorsalgias, que podem
acometer todas as regiões da coluna vertebral. Existe uma alta prevalência de
dorsalgias em crianças em idade escolar relacionadas à posição sentada e ao
hábito de carregar mochilas com excesso de peso (MILBRADT et al., 2011).
No estudo de Oshiro et al. (2007) os autores afirmam que a criança em
idade escolar permanece na postura sentada, utilizando carteira inapropriada,
adotando posições incorretas, ocasionando alterações degenerativas dos
tecidos e causando dor e enfraquecimento da musculatura abdominal e dorsal.
Nesse contexto, a escola é ambiente propício para o aparecimento e o
agravamento desses desvios posturais.
Barbosa et al. (2006) constataram que as crianças passam 250 minutos por
dia sentadas, 750 por semana e 3000 por mês. Ou seja, só nas atividades
escolares, o estudante passa, em média, 50 horas mensais sentado. Considerando
as AVDs, conclui-se que a criança passa 55% do tempo no dia na postura sentada.
A postura sentada provoca um aumento significativo da carga biomecânica sobre
os discos intervertebrais, principalmente na região lombar, e as posturas
biomecanicamente incorretas são agravantes para as deformidades da coluna
vertebral, principalmente em escolares em fase de desenvolvimento (PEREIRA et
al., 2006).
Ainhagne e Santhiago (2009) acrescentam que outro agravante é o fato de que, na
escola, as cadeiras são padronizadas, e, portanto, todas as crianças, de
diferentes tamanhos, idades e sexo usam o mesmo mobiliário. Além da mobília
inadequada, as alterações da coluna vertebral sofrem influencia das mochilas
que as crianças utilizam.
Salazar et al. (2011) realizaram uma pesquisa, na qual participaram 588
alunos, 51% do sexo masculino e 48,3% do sexo feminino, com idade de 6 a 11
anos, de 7 escolas públicas da Espanha. A média do peso das crianças era de
36,4 kg e a altura na média de 1,36 m. Desses escolares, 64,3% utilizavam
mochila de duas alças, 31,2% mochila de rodas e 4,5% mochila de uma alça. Os
pais foram averiguados. Dentre eles, 17,5% afirmaram que os filhos tinham dor na
coluna e 52,3% disseram que os filhos carregavam peso excessivo nas mochilas.
O peso médio das mochilas foi de 3,68 kg para todas as escolas, correspondendo
a 10,17% da massa corporal média das crianças, o que não é aconselhável.
Na pesquisa de Ortega et al. (2010), realizada com 1331 escolares, 51,2%
do sexo masculino e 48,8% do sexo feminino, com faixa etária compreendida entre
6 e 12 anos, obteve-se como resultado que 51,1% dos alunos utilizavam mochila de
alças e 48,9% deles usavam mochila com rodinhas, sendo que a mochila de alças
era preferência dos meninos (58,2%) e a mochila com rodinhas preferência das
meninas (56,4%).
Os autores supracitados realizaram testes de flexibilidade nos escolares,
relacionando-os às modalidades de transporte do material escolar. Essa
relação não apresentou resultado estatisticamente significante, o que levou a
considerar que a redução da flexibilidade na coluna e a presença de dor nessa
região não são causadas pelo acessório utilizado para o transporte do
material escolar. Porém, considerou-se que qualquer material utilizado de
maneira errada pode provocar alterações na coluna vertebral.
Portanto, a postura sentada acomete mais a coluna lombar, ao passo que o uso
incorreto da mochila acomete mais as regiões lombar e cervical da criança,
devido aos movimentos compensatórios promovidos na coluna vertebral desses
escolares.
O diagnóstico precoce das alterações posturais ainda na infância é de
importância fundamental pelo seu papel na gênese de alterações
biomecânicas, que cronicamente podem se tornar sintomáticas (BIANCHI et al.,
2005).
Toledo et al. (2011) afirmam que a fisioterapia conta com vários
métodos de tratamento para a escoliose, tais como o uso de colete e a
aplicação de técnicas como isostretching, osteopatia, método Klapp,
pilates, e Reeducação Postural Global (RPG).
Os autores supracitados realizaram uma pesquisa com 20 escolares de 10 anos de
idade, que cursavam o quinto ano do ensino fundamental e portadores de escoliose
funcional. Utilizado a RPG como método de tratamento, obteve-se uma
diminuição significativa do ângulo da escoliose, visto que esse método atua
do centro para as extremidades do corpo, restabelecendo o equilíbrio muscular.
Borghi et al. (2008) realizaram um estudo em 9 pacientes, com idade entre
7 e 18 anos, com duração de 24 sessões, utilizando a técnica de Isostretching.
A análise radiográfica final demostrou que um dos pacientes que apresentava
escoliose torácica à direita obteve o alinhamento total da coluna, 4
apresentaram diminuição da curva e 4 pioraram. Portanto, esse método
apresentou benefícios importantes, embora sem eficácia de 100%.
Benini e Karolczak (2010) acrescentam que a participação do fisioterapeuta no
desenvolvimento de programas de saúde nas escolas favorece a aquisição de
hábitos posturais saudáveis, melhorando, assim, a saúde dos estudantes.
Portanto, dentre as ações da fisioterapia, em relação às alterações da
coluna vertebral em escolares, existe a ação preventiva, que representa papel
importante a partir do momento em que essas ações evitam a instalação
temporária e permanente desses desvios posturais.
Souza Junior et al. (2011) concordam com as autoras supracitadas quando
afirmam que a fisioterapia preventiva é capaz de incluir programas de
educação postural, que transmitem o conhecimento sobre os desvios da coluna
vertebral, diminuindo, assim, as complicações entre os escolares.
Aguilar e Vargas (2007) acrescentam que o fisioterapeuta é um profissional com
conhecimentos de anatomia, biomecânica, fisiopatologia, dentre outras
disciplinas, e, por isso, encontra-se capacitado para atuar na ergonomia do
ambiente escolar, seja na forma preventiva, seja na corretiva.
Zapater et al. (2004) realizaram um trabalho com 71 alunos, sendo 26 de
escola municipal, 20 de escola particular, e 25 de escola estadual, com faixa
etária de 6 a 9 anos. Todas as escolas utilizavam o mesmo tipo de mobiliário:
mesa e cadeira individuais. Na análise dos resultados, foi verificado, no pré
e no pós-teste, que o programa educacional promoveu aumento do conhecimento dos
alunos sobre a postura sentada em todas as escolas estudadas, com resultados
estatisticamente significantes.
Na pesquisa de Fernandes et al. (2008) constatou-se, através da
avaliação pré e pós-intervenção das sessões educativas, que ocorreram
mudanças significantes no modo de transporte da mochila, no modelo e,
principalmente, na carga nelas transportada. Portanto, conclui-se que os
estudantes têm boa aceitação a programas de educação postural propostos por
fisioterapeutas.
Gonzáles et al. (2008) realizaram uma revisão de programas educativos
sobre educação postural, na qual foram analisados 8 estudos internacionais.
Foi observado que os trabalhos priorizavam analisar a mobília escolar,
objetivavam fornecer conhecimentos aos escolares relacionados à postura e aos
movimentos para realizar as AVDs, evitando o desenvolvimento de alterações na
coluna vertebral. Além disso, outros estudos focaram nas condutas de transporte
das mochilas. Depois da análise das pesquisas, os autores concluíram que os
programas de fisioterapia educativa no ambiente escolar são uma ferramenta
importante na prevenção de patologias que acometem a coluna vertebral.
Várias técnicas criativas estão sendo utilizadas na prevenção das
dorsalgias e das alterações posturais, como pode ser observado no trabalho de
Morales et al. (2010) que desenvolveram um programa de aprendizado de
hábitos posturais saudáveis com crianças de 10 a 14 anos de idade. Utilizavam
dois personagens para mostrar as posturas corretas e as erradas, seguido de
material audiovisual.
Rebolho et al. (2009) por sua vez, compararam duas estratégias de ensino
de hábitos posturais através de histórias em quadrinhos versus
experiência prática. A pesquisa foi realizada com crianças de 7 a 11 anos,
sendo que todas as técnicas se mostraram efetivas para ensinar e fixar os
conhecimentos posturais.
Desse modo, na tabela 1, estão expostos os trabalhos pesquisados sobre as
ações da fisioterapia explorados nesse estudo.
Conclusão
As posturas erradas adotadas pelas crianças na escola influenciam nas
alterações biomecânicas da coluna vertebral, tanto no plano sagital quanto no
plano frontal. As alterações mais encontradas foram a hiperlordose lombar e a
cervical, além da escoliose, sofrendo influência direta ou indireta da postura
sentada e do uso, muitas vezes inadequado, da mochila. A fisioterapia pode
desenvolver ações preventivas e reabilitativas no ambiente escolar,
mostrando-se eficaz em todos os aspectos.
Sugere-se que sejam realizadas mais pesquisas com o objetivo de avaliar o
impacto da formação da educação postural na prevenção de dores e
alterações nas costas, além de estudos a respeito da influência da má
postura e suas conseqüências quanto ao rendimento escolar, uma vez que no
decorrer da pesquisa não foi encontrado nenhum artigo acerca desse assunto.
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